Estresse minoritário em indivíduos homossexuais: manejo de casos clínicos pela TAC 09/03/2020 Psicologia e Análise do Comportamento Estresse minoritário em indivíduos homossexuais: manejo de casos clínicos pela TAC Compartilhar:

Por Amanda Campanini
Texto baseado na aula do Dr. Denis Zamignani para o curso Estudos de Caso em Terapia Analítico Comportamental

Ao longo do curso de Estudos de Caso em TAC, teremos a possibilidade de construir nossa própria prática clínica com respaldos práticos de como cada professor(a) e profissional atendem. A cada encontro podemos nos desenvolver a fim de construir ponte entre teoria e prática, há quem diga que “a prática clínica não está nos livros” e é aqui entra o raciocínio e manejo clínico trazidos a cada aula. São exemplos reais de como a teoria foi e continua sendo aplicada em casos práticos.

O raciocínio desse primeiro encontro começa pela Terapia Analítico Comportamental e sua importância para formulação de caso clínico, que vai desde estabelecer o foco terapêutico, a formas efetivas de intervenção.

A Formulação de Caso Clínico, de acordo com Zamignani, deve incluir 5 itens. São eles:

  • Informações sobre o problema do cliente;
  • Situações passadas que levaram ao(s) problema(s);
  • As situações atuais que mantêm este(s) problema(s);
  • Objetivos de curto e longo prazo para a terapia;
  • Proposta de um plano de tratamento.

Analisar as contingências para responder a essas e outras perguntas implica diretamente em desenvolver análise funcional e identificar as relações de dependência entre variáveis.

E, as variáveis podem contribuir para a presença de um sintoma. Estas variáveis podem ser proximais/atuais(que se entrelaçam na determinação do problema do cliente e antecedentes imediatos) ou variáveis distais que versa sobre a história de desenvolvimento do problema (eventos traumáticos, bullying, etc.). Fazem parte das variáveis proximais o que entendemos por: operantes, respondentes e verbais. Já as variáveis distais são: filogenéticas, históricas, desenvolvimentais e culturais.

Na clínica, tudo isso é dividido de uma maneira didática, para fins de estudo e avaliação. Na prática sabemos que as variáveis interagem reciprocamente, formando um conjunto de cadeias comportamentais únicas para cada cliente.

Durante a aula, o professor apresentou também uma série informações buscadas na literatura, especificamente sobre o caso e sobre o ambiente provavelmente encontrado por seu paciente.

O estresse minoritário, conforme apresentado, é um sofrimento produzido pela convivência em um “ambiente social estressante, que tende a estigmatizar e discriminar indivíduos pertencentes a grupos minoritários”. A visão de mundo heterossexista, que assume a heterossexualidade como a única manifestação apropriada de amor e sexualidade, desvaloriza tudo o que não é heterossexual, tendo um impacto negativo no desenvolvimento pessoal e emocional do indivíduo homossexual. Ao não representarem a visão de mundo de muitas pessoas, indivíduos homossexuais são estigmatizados. E podem passar a sofrer os efeitos estresse minoritário.

Quando crianças, temos a oportunidade de construir uma identidade de grupo, de pertencer a algo. Observamos e aprendemos com nossos cuidadores os recursos para lidarmos com atos discriminatórios. Já os indivíduos LGBTI+, por não pertencerem ao mesmo grupo que seus pais, podem não aprender com eles a lidar com a homofobia. Assim, uitas vezes são discriminados, rejeitados e oprimidos pela própria família através de críticas e invalidação de seus comportamentos.

A criança vai aprendendo a limitar sua interação com seus cuidadores e vai internalizando esse estigma social. Podemos falar, como exemplo, na homofobia internalizada, que faz com que a pessoa tenha uma vida paralela, escondida - “dentro do armário”.

Sendo o corpo a referência primária da identidade privada e estando esse corpo exposto a inúmeras experiências nas quais ele (e seus sentimentos, desejos e ações) é relacionado a avaliações e julgamentos negativos, punições concretas, humilhações e ridicularização, este corpo vai adquirindo ao longo do tempo um valor negativo, que pode ser traduzido como baixa autoestima ou, sendo alvo de repulsa ou rejeição pelo próprio indivíduo

Zamignani, D. R. e Banaco, R. A. (2020). Família Homoparental e Identidade.

O estresse minoritário vem do processo de aculturação. Há expectativas e regras relacionadas ao estereótipo de gênero, práticas culturais “esperadas” pela sociedade ocidental. Em geral, para nossos pares, comportamentos atípicos de gênero devem ser inibidos e/ou /punidos. Trata-se de uma sistemática invalidação dos sentimentos, pensamentos, desejos e necessidades da pessoa não inclusa.

A validação das experiências privadas é importante para a constituição de um self estável, regulação emocional e manejo satisfatório das relações afetivas. Para a aprendizagem de limites, então, é necessário que o indivíduo esteja atento ao impacto que as coisas têm sobre o seu corpo, especialmente sobre seus sentimentos, contribuindo então, para o desenvolvimento de uma autoestima e autoimagem positivas.

Pessoas que sofrem dessa invalidação ao longo de sua história muitas vezes não conseguem pensar em si contrapondo práticas culturais. Desde a infância tudo o que experimentam é que de algum modo profundo e inaceitável. O ser é sempre um ser diferente. Como resultado, há dificuldade de aceitação da própria sexualidade e integração de sua identidade como homossexual ou transexual, dificuldade no âmbito de relacionamentos sociais, isolamento e guetificação (dificuldade de se relacionar com “a maioria” heterossexual).

Por autodefesa, esse grupo de pessoas muitas vezes tende a desenvolver excessiva autonomia emocional, a não compartilhar seus sentimentos mais íntimos com pessoas próximas ou com o grupo que oprime. Há também uma compensação comum: a crença em não ser capaz de realizar coisas valorosas ou, ao contrário, uma tentativa de ser melhor para uma supercompensação, autoexigência e perfeccionismo. Para se fazer ver como “aceitável”, o indivíduo tentará constantemente provar que pode satisfazer as demandas da maioria.

E como fica o terapeuta, nesse cenário? De acordo com o professor, cabe ao terapeuta:

  • Acolhimento e validação: construção de repertório discriminativo de eventos privados e desenvolvimento de relações de intimidade.
  • Apoio para enfrentamento e resolução de problemas (a depender das áreas da vida mais afetadas).
  • Desenvolvimento de repertório social: tolerância a estimulação aversiva, manutenção de relações, aumento de reforçadores, aproximação da “família de escolha”.

Revelar parte da “clínica que não está descrita nos livros” é a nossa proposta em todos os nossos encontros. A cada aula, casos para você, profissional se desenvolver através do seu olhar, combinado ao olhar dos(as) nossos(as) professores(as) e profissionais clínicos.