Psicoterapia Breve 22/04/2024 Psicologia e Análise do Comportamento Psicoterapia Breve Compartilhar:

E se nem todos os problemas precisarem de um longo processo de investigação, análise e intervenção?

É possível que você já tenha se feito essa pergunta em algum momento. Também é possível que, por um “senso comum” do que se entende como o trabalho da psicologia, você possa ter estendido o tempo da psicoterapia para além do que era realmente necessário. Isso não quer dizer que o trabalho tenha sido uma “perda de tempo” no sentido de desenvolvimento do cliente, mas “prolongar por prolongar” pode gerar custos adicionais de dinheiro e tempo para quem contrata os serviços de profissionais da psicologia.

Se olharmos no dicionário, por exemplo, psicoterapia é definida como:

Conjunto das diferentes técnicas que visam ao tratamento de doenças e problemas psíquicos, de desajustamentos comportamentais e/ou outros problemas pressupostamente de natureza emocional; terapia.

Não há nenhuma definição temporal para o trabalho realizado. Por outro lado, é comum que o processo de psicoterapia seja entendido como algo longo, extremamente complexo e que vai, necessariamente, trabalhar aspectos que estão na sua vida desde a sua infância até o seu presente. De fato, há momentos em que essa configuração de psicoterapia é necessária e possível. Contudo, em outros momentos, talvez não haja necessidade e nem possibilidade de realizar esse tipo de trabalho. Como exemplo, podemos citar a necessidade do encurtamento do processo de trabalho dentro de hospitais, dado o tempo em que as pessoas ficam em atendimento, em escolas, dada a necessidade de resolver problemas pontuais dentro e fora de sala de aula e empresas em que, literalmente, tempo é dinheiro. Mas, não precisamos ficar somente nesses contextos. Até mesmo a clínica tradicional pode implementar modelos de psicoterapia mais curtos, visando resolver demandas específicas trazidas pelos clientes.

Porém, parece que fomos doutrinados a pensar que não é possível resolver de forma relativamente rápida as demandas dos nossos clientes. Parte dessa crença vem da ideia - correta, inclusive - de que não podemos estipular um prazo para a melhora do cliente. Isso é completamente real, pois o trabalho com cada cliente ocorre de forma personalizada e isso também vai impactar no tempo em psicoterapia. Agora, há uma diferença muito grande entre não estipular prazos e o foco dado ao longo do processo terapêutico que pode, sim, tornar a psicoterapia mais curta ou mais longa.

É a partir da discussão da possibilidade e da necessidade de um processo de psicoterapia mais curto ou mais longo que surgiu o modelo de Psicoterapia Breve.

Se você nunca viu esse termo ou se nunca parou para estudar sobre ele, eu aposto que somente de ler Psicoterapia Breve, você já deve ter tido algumas sensações esquisitas, como se isso fosse algo errado. Mas, garanto, não é!

A psicoterapia breve é uma intervenção terapêutica com tempo e objetivos limitados, visando a diminuição de custos relacionados à intervenção (Curwen et al. 2000). Esses objetivos são construídos a partir da análise individualizada das demandas do cliente. Portanto, a psicoterapia breve é constituída por três fatores: foco, objetivos e estratégias (Enéas et al. 2000).

Para definição do foco, levanta-se com o cliente quais são as demandas atuais dele ou dela. Essa dificuldade pode envolver a necessidade de se comunicar melhor, de realizar uma apresentação sem ficar muito ansioso ou ansiosa, de gestão de atividades e tempo, de estabelecimento de rotina etc. Nem sempre o foco de intervenção precisa se encontrar numa análise profunda em relação à vida do cliente. Esse foco pode ficar nas situações atuais: naquilo que, atualmente, impede a pessoa de fazer o que ela precisa fazer.

Uma vez que o foco foi definido, os objetivos podem ser traçados. Esse é um ponto de extrema importância, que ocorre numa relação dialética entre a terapeuta e o cliente. A partir das demandas levantadas, ambos definem o que poderá ser considerado como evolução/avanço/mudança. Assim, terapeuta e cliente conseguirão ter mais clareza de onde devem chegar e até onde o processo psicoterápico deve ser executado.

Feito isso, psicóloga pode fazer uma boa análise de quais são as principais estratégias para cumprir esses objetivos. A escolha dessas estratégias deve levar em consideração o custo-benefício entre o menor tempo e o melhor resultado possível. Portanto, veja como esses processos de definição do foco e objetivos da ajudam, inclusive, na implementação de uma prática mais alinhada com as melhores evidências existentes na ciência psicológica - para aquela demanda específica.

A ideia principal da psicoterapia breve é, portanto, melhorar o funcionamento adaptativo do cliente, tornando-o mais hábil para lidar com as demandas atuais e pontuais da vida dele ou dela. É importante deixar claro que isso também é desenvolvido em um processo de terapia “normal”. Então, não há um modelo melhor ou pior de psicoterapia, quando falamos de sua duração. O que temos são focos e necessidades diferentes que podem ser abordados de maneiras diferentes.

O processo duradouro da terapia, que foca em diversos aspectos da vida do cliente e o desenvolvimento geral de autoconhecimento, valores etc., continua muito importante e pode, inclusive, ser complementar ao que foi feito na psicoterapia breve - caso o cliente queira continuar o processo após o trabalho realizado.

Como exemplo disso, temos o nosso trabalho realizado na Incubadora de Psicólogos Clínicos. Nossa equipe é instruída a, inicialmente, trabalhar com as demandas atuais dos clientes. Para isso, a equipe utiliza uma planilha de registro de atendimentos que auxilia muito na tomada de decisão sobre o que fazer nas sessões seguintes. O uso dessa planilha é complementar ao registro comumente feito nas sessões. Ela envolve:

  • os dados gerais do cliente
  • a demanda inicial - definida pelo próprio cliente
  • a demanda secundária - definida pelo terapeuta junto ao cliente
  • os objetivos que o cliente tem com a terapia
  • os objetivos para a sessão atual
  • os objetivos para as sessões seguintes
  • os comportamentos inadequados - geralmente envolvidos na necessidade do cliente
  • os comportamentos adequados - geralmente envolvidos na mudança necessária

Ao usar essa planilha desde o primeiro atendimento, os terapeutas tornam o processo psicoterápico muito mais direcionado e tendem a focar naquilo que precisa ser alterado de imediato. Após a ocorrência de mudanças mais efetivas, muito clientes tendem a gostar do processo de terapia e acabam continuando para desenvolver outras questões, podendo, assim, iniciar um trabalho mais “demorado”.

E você? Já tinha ouvido falar sobre psicoterapia breve ou usa alguma ferramenta para sistematizar seus atendimentos?