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Categorias +Skinner vs Hayes
Todo mundo aqui já sabe que a Psicologia é uma área extremamente plural.
Existem inúmeras abordagens teóricas que visam entender e atuar no campo do comportamento humano. Acontece que, até dentro de uma mesma abordagem, podem existir vertentes de pensamentos que se distanciam e se aproximam em um continuum de desenvolvimento.
Podemos enxergar isso quando analisamos os pensamentos de Skinner e Hayes.
E, não! Nosso objetivo não é ficar dizendo que um é melhor que o outro. Isso já não cabe mais nas ciências do comportamento. Aqui, você verá que podemos aproveitar as linhas de pensamento de ambos e que isso fará com que a nossa atuação seja mais completa e alinhada com o desenvolvimento da AC.
Para isso… bora conhecer um pouquinho sobre cada um deles.
Burrhus Frederic Skinner, é amplamente reconhecido como uma das figuras mais influentes na psicologia do século XX. Skinner dedicou sua carreira ao estudo do comportamento dos organismos, focando especialmente na forma como o que fazemos é aprendido e modificado. Ele é conhecido por suas inovações na pesquisa experimental sobre o comportamento dos organismos, usando aparatos como a "Caixa de Skinner", onde animais, como ratos ou pombos, eram submetidos a estímulos controlados para observar e analisar seus comportamentos. O uso desses aparatos permitiu a descrição de diversos princípios comportamentais, como o condicionamento operante que descreve como os comportamentos dos organismos são moldadas por suas consequências. Ao longo do tempo, os princípios observados em laboratório foram ampliados para o comportamento humano. E boom! Foi observado que os comportamentos das pessoas podem ser entendidos, explicados, previstos e controlados a partir dos mesmos princípios.
Os princípios comportamentais observados em laboratório e ampliados para os seres humanos foram amarrados teoricamente pelo que conhecemos como Behaviorismo Radical. Essa proposta filosófica junto com seus dados experimentais fundamentou a ciência da Análise do Comportamento, criando campos de pesquisa e de atuação profissional, como a psicoterapia.
As propostas de Skinner, contudo, não pararam no desenvolvimento de aparatos para estudar o comportamento dos organismos ou da ampliação de seus modelos de análise para o comportamento humano. Skinner também se preocupava grandemente com a forma que os fenômenos comportamentais eram descritos. De uma forma resumida, podemos dizer que Skinner propôs que o comportamento humano fosse descrito em termos científicos, bem operacionalizados e que fossem claros o bastante para que diferentes pessoas pudessem (dentro de uma probabilidade, é claro) ficar sob controle dos mesmos aspectos ao ler/falar /escrever sobre o comportamento. Os termos utilizados por Skinner produziram uma grande ruptura entre as correntes psicológicas de sua época e a Análise do Comportamento. A estruturação dessa nova linguagem foi útil para estabelecer uma ciência capaz de entender, prever e controlar o comportamento de forma eficaz.
Na medida em que novos cientistas do comportamento foram surgindo, novos dados e variações nas interpretações acerca do comportamento humano foram desenvolvidas. Um dos principais nomes desse desenvolvimento é Steven Hayes. Para os chagados, apenas Hayes. =)
Hayes é um psicólogo clínico e pesquisador norte-americano, nascido em 1948, conhecido por suas contribuições significativas à psicologia clínica e à terapia comportamental. Ele é particularmente reconhecido como o fundador da Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), uma abordagem que combina elementos de várias ciências comportamentais.
Arriscando sermos simplistas, podemos dizer que o principal tópico de “diferença” entre Skinner e Hayes está na noção de Comportamento Verbal e, também, em como o conhecimento desse fenômeno é utilizado. Colocamos diferença entre aspas, pois segue o que descrevemos no início: os conceitos nas ciências do comportamento se aproximam e se distanciam em um continuum. Veja só… Hayes e seus colaboradores criticaram a definição de Skinner sobre Comportamento Verbal e desenvolveram uma definição alternativa. Contudo, essa definição também é pautada em um paradigma monista, funcional e contextualista, como Skinner fez. Assim, há pontos com grandes diferenças e outros como muita proximidade. Assumir o desenvolvimento das ciências do comportamento, dessa forma, nos permite caminhar de maneira mais parcimoniosa.
O foco dado por Hayes, pelo menos inicialmente, ao comportamento verbal ocorreu pela noção de que muitos dos aspectos que geram sofrimento ou melhora na vida das pessoas está diretamente ligado a linguagem. Assim, se distanciando de uma proposta mais inicial da análise do comportamento em que o foco estava na modificação de comportamentos a partir do manejo direto das contingências, Hayes e colaboradores começaram a desenvolver formas de entender como a linguagem pode oferecer acesso aos sentimentos das pessoas em relação ao mundo, em relação a si mesmas e, também, como a linguagem pode levar a processos de aceitação daquilo que não se tem controle ou do estabelecimento de novas formas de se relacionar com o contexto em que as pessoas são expostas visando produzir vidas mais valorosas.
Junto a isso, Hayes trouxe o amplo uso de “termos médios” para explicar o comportamento humano: conceitos não tão cientificamente acurados, mas facilmente entendidos por pessoas de fora da análise do comportamento. Isso contrasta muito com a proposta de Skinner em relação ao uso de termos científicos para descrever o comportamento dos organismos.
Mas… vamos olhar mais de perto essa “diferença”.
Skinner estava em um período de estabelecimento de uma ciência. Ele precisava se preocupar fortemente na criação de uma linguagem clara e coesa, bem como na criação de uma comunidade verbal que se comunicasse de forma semelhante e eficaz. Quando pensamos enquanto cientistas, temos, sim, que ser rígidos com quais tipos de conceitos iremos utilizar para descrever um fenômeno.
Hayes também tem sua vertente pesquisador/cientista. Contudo, ele surgiu em um momento em que a Análise do Comportamento já tinha se estabelecido como uma ciência. O que precisávamos (e ainda precisamos) era produzir uma maior permeabilidade na população em geral. Isso só se faz com o uso de termos médios. Assim, por mais que Hayes pareça “fugir” da proposta de Skinner, na verdade, ele passou a torná-la acessível para os não analistas do comportamento. E esse é o ponto que gera muito problema, mas que dificilmente paramos para pensar: Skinner e Hayes tinham objetivos diferentes. O primeiro queria descrever o comportamento em termos científicos. O segundo queria tornar esse conhecimento acessível para quem não é analista do comportamento.
Portanto, quando pensamos em uma “briga” de Skinner vs Hayes, estamos nos perdendo em diferentes níveis de análise. Talvez as diferenças entre eles sejam o que é necessário para a Análise do Comportamento não morrer, sobrevivendo apenas nas vielas de uma comunidade verbal que quase não se comunica com outras áreas.
Nessa história, poderíamos contar diversos outros aspectos de um e de outro. Poderíamos, também, contar como saímos de Skinner e fomos parar nas Terapias Contextuais, mas isso é conteúdo para outro momento. Agora, se você tem vontade de saber de tudo isso e, ainda assim, ter uma boa formação clínica, conheça a nossa Pós-graduação em Terapias Contextuais.
Dr. André Connor de Méo Luiz
Coordenador Acadêmico - Instituto Continuum